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Chico Buarque




Альбом Chico Buarque


Chico Buarque de Hollanda (1966)
1966
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Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

O homem sério que contava dinheiro parou
O faroleiro que contava vantagem parou
A namorada que contava as estrelas parou
Para ver, ouvir e dar passagem
A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela
A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu
A lua cheia que vivia escondida surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

Mas para meu desencanto
O que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois que a banda passou

E cada qual no seu canto
E em cada canto uma dor
Depois da banda passar
Cantando coisas de amor

. . .


Tem mais samba no encontro
Que na espera
Tem mais samba a maldade
Que a ferida
Tem mais samba no porto
Que na vela
Tem mais samba o perdão
Que a despedida
Tem mais samba nas mãos
Do que nos olhos
Tem mais samba no chão
Do que na lua

Tem mais samba no homem
Que trabalha
Tem mais samba no som
Que vem da rua
Tem mais samba no peito
De quem chora
Tem mais samba no pranto
De quem vê
Que o bom samba
Não tem lugar nem hora
O coração de fora
Samba sem querer

Vem que passa
Teu sofrer
Se todo mundo sambasse
Seria tão fácil viver

. . .


A Rita levou meu sorriso
No sorriso dela
Meu assunto
Levou junto com ela
E o que me é de direito
Arrancou-me do peito
E tem mais
Levou seu retrato, seu trapo, seu prato
Que papel!
Uma imagem de São Francisco
E um bom disco de Noel

A Rita matou nosso amor
De vingança
Nem herança deixou
Não levou um tostão
Porque não tinha não
Mas causou perdas e danos
Levou os meus planos
Meu pobres enganos
Os meus vinte anos
O meu coração
E além de tudo
Me deixou mudo
Um violão

. . .


Ela e sua menina
Ela e seu tricô
Ela e sua janela, espiando
Com tanta moça aí na rua
O seu amor só pode estar dançando
Da sua janela imagina ela
Por onde hoje ele anda
E ela vai talvez
Sair uma vez na varanda

Ela e um fogareiro
Ela e seu calor
Ela e sua janela, esperando
Con tão pouco dinheiro
Será que o seu amor ainda está jogando
Da sua janela uma vaga estrela
E um pedaço de lua
E ela vai talvez
Sair outra vez na rua

Ela e seu castigo
Ela e seu penar
Ela e sua janela, querendo
Com tanto velho amigo
O seu amor num bar só pode estar bebendo
Mas outro moreno joga um novo aceno
E uma jura fingida
E ela vai talvez
Viver duma vez a vida

. . .


Madalena foi pro mar
E eu fiquei a ver navios
Quem com ela se encontrar
Diga lá no alto mar
Que é preciso voltar já
Pra cuidar dos nossos filhos

Pra zombar dos olhos meus
No alto mar a vela acena
Tanto jeito tem de adeus
Tanto adeus de Madalena

Madalena foi pro mar
E eu fiquei a ver navios
Quem com ela se encontrar
Diga lá no alto mar
Que é preciso voltar já
Pra cuidar dos nossos filhos

É preciso não chorar
Maldizer, não vale a pena
Jesus manda perdoar
A mulher que é Madalena

Madalena foi pro mar
E eu fiquei a ver navios

. . .


Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã, parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem
De quem não tem vintém
Pedro pedreiro fica assim pensando
Assim pensando o tempo passa
E a gente vai ficanto pra trás
Esperando, esperando, esperando
Esperando o sol
Esperando o trem
Esperando o aumento
Desde o ano passado
Para o mês que vem

Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã, parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem
De quem não tem vintém
Pedro pedreiro espera o carnaval
E a sorte grande do bilhete pela federal
Todo mês
Esperando, esperando, esperando
Esperando o sol
Esperando o trem
Esperando o aumento
Para o mês que vem
Esperando a festa
Esperando a sorte
E a mulher de Pedro
Está esperando um filho
Pra esperar também

Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã, parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem
De quem não tem vintém
Pedro pedreiro esta esperando a morte
Ou esperando o dia de voltar pro norte
Pedro nã sabe mas talvez no fundo
Espera alguma coisa coisa mais linda que o mundo
Maior do que o mar
Mas pra que sonhar
Se dá o desespero de esperar demais
Pedro pedreiro quer voltar atrás
Quer ser pedreiro pobre e nada mais
Sem ficar esperando, esperando, esperando
Esperando o sol
Esperando o trem
Esperando o aumento para o mês que vem
Esperando um filho pra esperar também,
Esperando a festa
Esperando a sorte
Esperando a morte
Esperando o norte
Esperando o dia de esperar ninguém
Esperando enfim nada mais além
Da esperança aflita, bendita, infinita
Do apito do trem

Pedro pedreiro pedreiro esperando
Pedro pedreiro pedreiro esperando
Pedro pedreiro pedreiro esperando o trem
Que já vem
Que já vem
Que já vem . . .

. . .


Hoje, eu quero
Fazer o meu carnaval
Se o tempo passou, espero
Que ninguém me leve a mal
Mas se o samba quer que eu prossiga
Eu não contrario não
Com o samba eu não compro briga
Do samba eu não abro mão

Amanhã, ninguém sabe
Traga-me um violão
Antes que o amor acabe
Traga-me um violão
Traga-me um violão
Antes que o amor acabe

Hoje, nada
Me cala este violão
Eu faço uam batucada
Eu faço uma evolução
Quero ver a tristeza de parte
Quero ver o samba ferver
No corpo da porta-estandarte
Que o meu violão vai trazer

Amanhã, ninguém sabe
Traga-me uma morena
Antes que o amor acabe
Traga-me uma morena
Traga-me uma morena
Antes que o amor acabe

Hoje, pena seria esperar em vão
Eu já tenho uma morena
Eu já tenho um violão
Se o violão insistir, na certa
A morena ainda vem dançar
A roda fica aberta
E a banda vai passar

Amanhã, ninguém sabe
No peito de um contador
Mais um canto sempre cabe
Eu quero cantar o amor
Eu quero cantar o amor
Antes que o amor acabe

. . .


Você não ouviu
O samba que eu lhe trouxe
Ai, eu lhe trouxe rosas
Ai, eu lhe trouxe um doce
As rosas vão murchando
E o que era doce
Acabou-se

Você me desconserta
Pensa que está certa
Porém não se iluda
No fim do mês
Quando o dinheiro aperta
Você corre esperta
E vem pedir ajuda
Eu lhe procuro
Mas você se esconde
Não me diz aonde
Nem quer ver seu filho
No fim do mês
É que você responde
E no primeiro bonde
Vem pedir auxílio

Você diz
Que minha rosa é frágil
Que o meu samba é plágio
E é só lugar comum
No fim do mês
Sei que você vem ágil
Passa um curto estágio
E eu fico sem nenhum
A sua dança vai durar enquanto
Você tem encanto
E não tem solidão
No fim da festa
Há de escutar meu canto
E vir correndo em pranto
Me pedir perdão
(Ou não?)

. . .


Juca foi autuado em flagrante
Como meliante
Pois sambava bem diante
Da janela de Maria
Bem no meio da alegria
A noite virou dia
O seu luar de prata
Virou chuva fria
A sua serenata
Não acordou Maria

Juca ficou desapontado
Declarou ao delegado
Não saber se amor é crime
Ou se samba é pecado
Em legítima defesa
Batucou assim na mesa
O delegado é bamba
Na delegacia
Mas nunca fez samba
Nunca viu Maria

. . .


Não chore ainda não
Que eu tenho um violão
E nós vamos cantar
Felicidade aqui pode passar e ouvir
E se ela for de samba há de querer ficar
Seu padre toca o sino que é pra todo mundo saber
Que a noite é criança, que o samba é menino
Que a dor é tão velha que pode morrer

Olê, olê, olê, olá
Tem samba de sobra
Quem sabe sambar
Que entre na roda
Que mostre o gingado
Mas muito cuidado
Não vale chorar

Não chore ainda não
Que eu tenho uma razão
Pra você não chorar
Amiga, me perdoa, se eu insisto à toa
Mas a vida é boa para quem cantar
Meu pinho, toca forte que é pra todo mundo acordar
Não fale da vida, nem fale da morte
Tem dó da menina, não deixa chorar

Olê, olê, olê, olá
Tem samba de sobra
Quem sabe sambar
Que entre na roda
Que mostre o gingado
Mas muito cuidado
Não vale chorar

Não chore ainda não
Que eu tenho a impressão
Que o samba vem aí
É um samba tão imenso que eu às vezes penso
Que o próprio tempo vai parar pra ouvir
Luar, espere um pouco, que é pra o meu samba poder chegar
Eu sei que o violão está fraco, está rouco
Mas a minha voz não cansou de chamar

Olê, olê, olê, olá
Tem samba de sobra
Ninguém quer sambar
Não há mais quem cante
Nem há mais lugar
O sol chegou antes
Do samba chegar
Quem passa nem liga
Já vai trabalhar
E você, minha amiga
Já pode chorar

. . .


Quem canta comigo
Canta o meu refrão
Meu melhor amigo
É meu violão
Meu melhor amigo
É meu violão

Já chorei sentido
De desilusão
Hoje estou crescido
Já não choro não
Já brinquei de bola
Já soltei balão
Mas tive que fugir da escola
Pra aprender a lição

Quem canta comigo
Canta o meu refrão
Meu melhor amigo
É meu violão
Meu melhor amigo
É meu violão

O refrão que eu faço
É pra você saber
Que eu não vou dar braço
Pra ninguém torcer
Deixa de feitiço
Que eu não mudo não
Pois eu sou sem compromisso
Sem relógio e sem patrão

Quem canta comigo
Canta o meu refrão
Meu melhor amigo
É meu violão
Meu melhor amigo
É meu violão

Nasci sem sorte
Moro num barraco
Mas meu santo é forte
O samba é meu fraco
No meu samba eu digo
O que é de coração

Quem canta comigo
Canta o meu refrão
Quem canta comigo
Canta o meu refrão
Meu melhor amigo
É meu violão
Meu melhor amigo
É meu violão

. . .


Carnaval, desengano
Deixei a dor em casa me esperando
E brinquei e gritei e fui vestido de rei
Quarta-feira sempre desce o pano

Carnaval, desengano
Essa morena me deixou sonhando
Mão na mão, pé no chão
E hoje nem lembra não
Quarta-feira sempre desce o pano

Era uma canção, um só cordão
E uma vontade
De tomar a mão
De cada irmão pela cidade

No carnaval, esperança
Que gente longe viva na lembrança
Que gente triste possa entrar na dança
Que gente grande saiba ser criança

. . .


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